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Thursday, May 16, 2024

É preciso sofrer para se tornar mais evoluído?





Ultimamente tenho pensado muito na minha morte. Já até pensei como será o meu caixão e velório, dei uma olhada nos custos - espero deixar tudo pago e acertado antes de morrer, mas não faço ideia de quando isso ocorrerá.

Talvez eu esteja preparando um réquiem e não tenha noção exata disso. Talvez eu tenha conseguido, por algum motivo milagroso, me desvencilhar do ciclo de encarnações da face da Terra e portanto, passei ao "mundos dos mortos" (Duat, em egípcio antigo).

A segunda premissa parece mais correta, mas eu honestamente não sei dizer se é o caso.

Pode ser que em breve assumirei outro cargo público e dele não devo me desvencilhar, até aposentar (quem sabe deopis tentar um outro cargo público, mas igualmente distante da música, ciência e coisas que eu gosto e têm a ver comigo). Vai ver isso será como uma morte, para mim.

Ou talvez tenha atingido um grau de desenvolvimento em que a existência deixa de ser importante. Abre-se mão facilmente de qualquer coisa, até mesmo da consciência, da vida, dos conhecimentos, da Obra, de tudo.

Se o meu destino for reencarnar como um leigo em espiritualidade, numa família de pessoas legais mas sem nenhuma capacidade espiritual... parece muito interessante. Se for esquecer tudo que sei.. parece empolgante. Quem sabe eu vire filho de um agricultor e fique a vida toda plantando soja sem nem sonhar com o que estou escrevendo agora?

Mas se for ser confinado no cone da lua para sentir o sofrimento eterno, também está muito bem ajustado e bom. Deve ser uma experiência bem diferente, também. Dar-se em holocausto acaba sendo isso - se deixar levar.

Se o destino é ser revivido nos Mundos Interiores, pode ser bom também, acredito que tenha muitos amigos por lá. Mas se não tiver, com certeza farei muitos amigos e amigas bons por lá.

Quando nem mesmo a morte em defintiivo, a dissolução da consciência se torna algo corriqueiro, o mundo perde força de argumentação de uma forma impressionante.

"Você será demitido do trabalho, Ariomester, se não entregar os trabalhos no prazo". Ótimo, morrerei em pobreza então. Meus últimos momentos serão na calçada passando frio, sujo e doente. Trágico, mas é o que temos para hoje.

"Você será um subsecretário de Estado, renomado e admirado". Ok, se me deixarem manter meu cabelo grande e tocando minha bateria em casa, já está bem pago - façam todo o resto como julgarem melhor.

Outro dia eu escrevi um texto interessante "Com o que você sonha, Ariomester?"

Isso porque "com o que você deseja?" tem a seguinte resposta: nada. Não desejo nada - nem sucesso, nem sorte, nem vida, nem morte.

Nós, pessoas muito antigas na chamada Obra do Eterno passamos por muitas coisas curiosas em encarnações passadas; e de forma tão repetitiva que até hoje trazemos isso implicitamente.

Os rituais TCHEND são um exemplo. Bem descritos no livro "O Tibet e a Teosofia", escrito pelo grande Mario Roso de Luna, em parceria ao Prof. Henrique José de Souza, trazem estas informações. O TCHEND é um ritual transcendental em que o discípulo fica por semanas andando por cemitérios e lugares repletos de obsessores e seres inferiorres e malignos, deixando que se prendam a ele.

A seguir, dorme fisicamente, despertando no astral como vítima desses demônios, oferecendo-se em sacrifício para eles. Dois resultados acontecem:  a pessoa surta e se torna um doido varrido; ou se torna tão segura de si que poucas coisas a abalam.

Esses dias uma amiga escreveu num grupo dedicado a estudiosos da obra do Prof. Henrique José de Souza:


"Temos a idéia de que nossas sombras são "ruins", mas só existe evolução quando olhamos pra elas, penso eu (nossas sombras). Não acredito que se iluminar seja algo, confortável, tranquilo kkkkkkkkkkkkk pelo contrário." 


Ai que está o equívoco. 

Quanto mais iluminada é a criatura mais feliz ela se torna, mas ao mesmo tempo mais sensível. Uma coisa inexiste sem a outra: ninguém grosseiro é feliz e ninguém feliz é grosseiro. Os grosseiros são como a cobra que come um bezerro e fica tão inchada que nem consegue sair do lugar, com a barriga cheia e um monte de hormônios fazendo ela parar de comer, sentindo bem etc porque senão ela vai morrer de comer.

Mais ou menos a mesma ideia se aplica ao conceito de "felicidade" que utilizamos cotidianamente.

Pessoas cercadas or dinheiro, prestígio e outras coisas fáceis de destruir e destituir, sentindo-se seguras porque os hormônios sociais (vaidade, por exemplo) estão fazendo com que a pessoa deixe de procurar algo que a desafie a ser alguém melhor; algo que a afaste das suas crenças para abraçar uma outra que sintetiza e dela todas as outras derivam: o ser humano é coletivo e não individual.

Chega um ponto engraçado em que se começa a entender o que as plantas e animais querem dizer. É muito estranho porque eles não têm voz, não organizam palavras como fazemos, mas é possível entende-los como se fosse uma criança bem pequena.

Isso não vem sem uma percepção semelhante das pessoas e suas atitudes. E isso muitas vezes machuca a pessoa evoluída profundamente, dói, incomoda, porque a sensibilidade aumentada faz qualquer arranhão parecer uma amputação. Tudo machuca, tudo dói, tudo incomoda e irrita.

Mas curiosamente existe um estado de felicidade contínuo que permanece mesmo com a dor.

Se uma pessoa querida briga conosco, morre ou vai embora, é um choque muito mais forte do que para qualquer outra pessoa, por causa da sensibilidade aumentada. Mas meio que do nada volta uma sensação de tranquilidade muito grande.

Diferente da tranquilidade a partir de conqusitas materiais (ter dinheiro, por exemplo), é uma tranquilidade em mesmo abandonar o mundo, o corpo e ir embora se for preciso, sem pensar duas vezes. Ao invés de ter medo da morte, passamos a ter um pensamento constante sobre a morte, como algo que um dia ocorrerá, mas seguiremos existindo, mesmo assim.

É uma tranquilidade que literalmente faz a pessoa não se importar se está viva ou não, se tem um corpo físico ou não, se tem dinheiro ou não. Essa sensação não tem nada a ver com as noções usuais de felicidade.

Isso torna o sujeito incompatível com o mundo, de modo geral, pois inviabiliza atitudes típicas: desejar coisas, almejar fortunas, prestígio e amores; se mostrar mais forte, resoluto e bonito que os outros. Ter uma atitude impositiva e tempestiva por ser alguém "melhor".

Nada disso - se parece correto ou adequado se humilhar, a pessoa evoluída se humilhará antecipando até a humilhação que outros lhe infringiriam; se não há necessidade de liderar, não irá tomar para si esse fardo. Se não é preciso ensinar, não ficará ensinando aos quatro ventos. 

Com enorme frequência serão consideradas pessoas desligadas, passivas, bobas, sem iniciativa, que desdenham dos demais, que não valorizam aquilo que todos valorizam (isso é verdade - o mundo individual passa a ser tão rico e inevitável, que faz o resto desmoronar).

Se, em geral, as pessoas temem perder dinheiro, prestígio e a saúde, para quem já está um pouco adiantado nesta senda tudo isso poderia ser levado embora, mesmo a consciência e noção do "eu"; mesmo tudo que se aprendeu, tudo que se conquistou.

Exatamente por isso que tais pessoas, via de regra, são preservadas após a morte, nos Mundos Interiores, tanto acordadas quanto adormecidas no chamado "sono paranishpâmico".

Tornar-se mais sensível não é um caminho, mas um efeito do aprimoramento espiritual. Isso faz com que sintamos de forma aumentada tudo que os outros sentem: se há uma mensagem emocionante, ou cena bonita, em que as pessoas "comuns" choram, nós choraremos ainda mais que elas, pela beleza da cena ou emoção da mensagem.

Isso é diferente dos "ioguis", que munidos de uma suposta racionalidade se furtam a sentir aquilo que as pessoas comuns sentem. Se esquivam de ouvirem e dançarem as músicas mais tocadas nas rádios, se emocionar com as cenas tidas como bobas veiculadas na TV e no cinema.

Quando existe verdadeira ascenção espiritual ocorre o oposto disso - ao invés de o sujeito se revestir de justificativas para minar aquilo que sente, há um mergulho no sentimento.

O intelectual pode evitar sentir feliz ao assistir um filme de comédia romântica pois assumiu para si que a heterossexualidade e maligna e que os roteiros de tais obras são machistas. Uma pessoa espiritualizada jamais veria dessa forma - acharia graça nas cenas engraçadas e ficaria feliz com o final feliz. Mas ainda assim entenderia que é uma obra que apresenta pessoas estereotipadas que poderiam consolidar papéis sociais.

Porém, a inteligência ensina que é preciso determinado nível de influência para que algo se torne verdadeiro na humanidade. O campo de influência de uma comédia romântica não é abrangente e nem persistente o bastante para que a humanidade tome aquilo por regra; e ainda menos que de alguma forma enfraqueça tentativas válidas de reduzir o machismo na sociedade.

Logo, a pessoa verdadeiramente evoluída veria graça num filme bobo porque sabe que é um filme bobo; mas não veria graça num influenciador "bobo" que está recrutando as pessoas para votarem em políticos corruptos e malignos; ou disseminando ideias perigosas como as do movimento antivacina.

Um filme bobo é essenciamente uma coisa boba, mesmo que seja machista. Logo, uma pessoa verdadeiramente sensível perceberá claramente como as coisas são: um filme bobo repleto de bobeiras bobas. E do outro lado, o que de fato é: uma plataforma de governo nefasta disfarçada de "coisa engraçadinha". Não tem graça.

As músicas, filmes e tudo mais da vida toma uma direção curiosamente similar; um artista muito consagrado e outro iniciante tornam-se parecidos. O conhecimento cadêmico e o popular se msotram meio que como a mesma história contada de duas formas diferentes; o emaranhado complicado de palavras, conceitos e construtos que os intelectuais utilizam se mostram exatamente como são: um emaranhado de palavras que não levam a lugar algum.

Ouvir um concerto de Debussy ou um show do Gusttavo Lima deixam de ser coisas radicalmente diferentes e se tornam apenas esteticamente diferentes: um pode ser numa pequena sala de concerto, outro num estádio; um pode explorar melodias em notas de tensão de acordes complicados, o outro melodias simples sobre acordes comuns - as diferenças páram por aí.

Deixa de existir um "conhecimento, música ou hábito" superior e outro "profano". Esse tipo de arbitragem se torna impossível. para quem subiu alguns degraus na escada do desenvolvimento espiritual.

É muito difícil falar sobre sofrimento, nesses termos.

O que é sofrer?

Como disse, a elevação da consciência não faz repelir os menos evoluídos, é o oposto - faz querer cuidar, orientar, ensinar, ser amigo, ser parceiro, falar seu idioma, fazer o que fazem só para ficar perto como se fossem irmãos mais novos de um irmão mais velho (nome do meu segundo livro, em preparação).

Nosso irmão pode ser completamente diferente de nós... e mesmo assim ainda seremos capazes de gostar da sua presença e ansiosamente aguardar por uma oportunidade de o ajudar e ser uma pessoa melhor.

O desenvolvimento espiritual (leia-se: ampliação significativa da inteligência, adoção da bondade como forma de agir) não faz repelir ou sentir-se mal entre os "comuns". O que machuca são as coisas que eles fazem, mas não representam risco ao desenvolvimento espiritual de pessoas mais adiantadas.

Dói porque muitas vezes as pessoas não escolhem o caminho do amor e gentileza: gritam, xingam, humilham, maltratam os outros (incluindo nestes gente mais evoluída que elas), que sentem-se mal com isso. Sentem-se oprimidos, machucados, magoados etc e isso tudo ocorre aos mais adiantados, porém numa magnitude muitas vezes maior que para os comuns.

Mas ao mesmo tempo, a recuperação disso é normalmente mais rápida. Por isso os lamaístas adotavam uma postura um tanto intransigente de não reagir a nada. Se o xingasse, batesse ou maltratasse, faria cara de paisagem e continuaria firme e forte - porque o sentimento ruim passará espontaneamente, levando com ele a dor do escárnio.

E a seguir voltará a brilhar o sol da Mônada, expresso numa sensação engraçada de conexão a todas a coisas e de responsabilização perante os menos consicentes, sejam pessoas ou não. Expresso, também, num turbilhão de grandes ideias, projetos, sonhos, músicas, imagens, revelações e mais um monte de coisas evoluídas.

O aumento na sensibilidade e capacidade intelectual faz com que as músicas se tornem mais intensas que o usual, mas ao mesmo tempo amparadas pela lógica, para aqueles que estudaram música; para os artistas visuais, arquitetos, designers, certamente as formas e cores se tornam muito mais imponentes do que costumavam ser; para quem não desenvolveu nada... deixemos por isso mesmo.

Tal é a dinâmica do chamado "mental abstrato", em que tudo está desconectado, podendo (ou não) ser conjugado através de lógica. É como um jogo de xadrez em mais que três dimensões, enquanto o chamado "mental concreto" é como um jogo de damas num tabuleiro bidimensional.

E o sofrimento, onde entra nisso?

A meu ver, não entra, porque não é caminho.

E quando a pessoa se torna de fato evoluída, aquilo que conhecemos como "sofrimento" deixa de ser sofrido e passa a ser apenas um incômodo que pode ser facilmente evitado, afastando-se de tudo e todos (como eu já pensei em fazer), ou aprendemos a viver com o incômodo, como pagamento (ou tributo) natural do convívio de pessoas que não precisam, em absoluto, da nossa ajuda.

Mas que é muito legal ter por perto, dar risada juntos, contar piada, falar sobre o nosso Galo (Clube Atlético Mineiro), cantar junto que estamos bloqueados (é muita raiva misturada com tristeza), comer os pastéis e comidas simples preparadas em locais igualmente simples.

E nada disso é bonito, ou intelectualmente justificado - é uma necessidade, simplesmente conviver com todos.

Coisas aí para pensar.








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